Protease na nutrição de suínos: Impactos na digestibilidade, saúde e viabilidade econômica
Introdução
Dentre os diversos aditivos alimentares utilizados na suinocultura, as enzimas exógenas, como as proteases, têm grande destaque por sua capacidade de melhorar a digestibilidade dos nutrientes da dieta, reduzir custos com alimentação, e promover benefícios à saúde intestinal dos animais (Mc Alpine et al., 2012; Upadhaya et al., 2016; Kim et al., 2020). Isso é especialmente importante ao considerar a qualidade variável dos ingredientes utilizados na dieta, que nem sempre são uma fonte de nutrientes de qualidade e alta digestão.
O uso da enzima exógena protease está inserido nesse contexto, por se tratar de uma enzima que vai complementar a ação das enzimas endógenas do animal, hidrolisando proteínas resistentes à ação das proteases endógenas (Mc Alpine et al., 2012), como as proteínas de origem vegetal (González-Ortiz e Walk, 2020). Este artigo traz os efeitos da inclusão de protease na nutrição de suínos em diferentes fases sobre a digestibilidade de proteínas da dieta e a saúde intestinal dos animais.
Protease na nutrição de suínos
Proteases são enzimas, portanto proteínas, que catalisam a hidrólise de ligações peptídicas, resultando em peptídeos menores e aminoácidos livres de diferentes fontes de proteína (Souza, 2021), que posteriormente serão absorvidos e utilizados pelos animais.
Os suínos têm a capacidade de produzir proteases endógenas, como a pepsina (com ação estomacal) e a tripsina (ação intestinal). No entanto, a capacidade de digestão de proteínas pode ser limitada por fatores como a idade do animal, a qualidade das matérias-primas, quantidade de ingredientes de origem vegetal na dieta, que têm digestão mais difícil, e a presença de antinutrientes (Farias, 2021).
As proteases atuam justamente quebrando proteínas de armazenamento e sobre os fatores antinutricionais em ingredientes de origem vegetal, principalmente em leguminosas (Cowieson et al., 2006). Os fatores antinutricionais podem ser os inibidores de tripsina, lecitinas e proteínas antigênicas, responsáveis pela diminuição da digestibilidade de proteínas. Com isso, a digestibilidade das proteínas tende a aumentar com a inclusão de proteases na dieta (Bedford e Partridge, 2010; Farias, 2021). Com isso, é esperado um melhor desempenho dos animais, além de uma redução na excreção de nitrogênio, tornando a produção mais sustentável.
Benefícios da protease sobre a digestibilidade dos nutrientes da dieta e o desempenho de suínos em diferentes fases de crescimento
Como discutido anteriormente, a ação de proteases é dependente de alguns fatores relativos ao organismo dos animais (fase de crescimento, sexo, sanidade) e à qualidade dos ingredientes da dieta (origem animal ou vegetal). Portanto, ainda é variável em estudos os resultados de desempenho quando a protease exógena é ofertada aos animais.
Em leitões desmamados, um estudo de Park et al. (2020) avaliando o efeito da inclusão de 0,02% de protease produzida em Bacillus licheniformis, em dietas com baixa inclusão de proteína bruta (PB) para a fase (22.51%), relataram um melhor desempenho dos animais com a inclusão da protease, se igualando aos resultados da dieta com a inclusão de PB ideal para a fase. Além do desempenho, a digestibilidade da matéria seca, proteína e energia também foi igual à dieta com PB ideal. Nesse caso, o preço seria o fator determinante para o seu uso.
Já nas fases de crescimento e terminação, o estudo de Choe et al. (2017), que comparou uma dieta padrão com ou sem inclusão de protease, mostrou que a protease diminuiu o consumo de ração mantendo o ganho de peso, ou seja, a conversão alimentar foi melhor com a protease. Em se tratando de uma produção em que a dieta tem o maior impacto sobre os custos, essa redução no consumo mantendo o ganho de peso representa uma grande economia no processo.
Outro trabalho avaliou o efeito da protease para suínos em crescimento e os resultados mostraram que a inclusão de protease na dieta promoveu um aumento no ganho de peso, melhora na conversão alimentar, aumento na digestibilidade da matéria seca e do nitrogênio, e diminuição da emissão de amônia fecal (Payling et al., 2017).
Esses efeitos em conjunto contribuem para uma produção mais sustentável e com maior produtividade, o que é particularmente importante em cenários de produção mais difíceis.
Benefícios da protease exógena para a saúde intestinal de suínos
A saúde intestinal é muito importante para garantir um bom desempenho e o bem-estar dos suínos. A suplementação de protease tem sido associada a melhorias na saúde intestinal, principalmente pela redução na quantidade de proteínas não digeridas que chegam ao intestino grosso, e podem servir como substrato para o crescimento de bactérias patogênicas, como a Escherichia coli e o Clostridium perfringens, que estão associadas a doenças entéricas, como a diarreia pós-desmame (Wu et al., 2015; Engelsmann et al., 2022).
Esse efeito é mais observado durante o início da fase de creche, quando a capacidade digestiva dos animais está comprometida. A protease pode atuar nessa fase diminuindo a incidência de diarreia (Zhang et al., 2014). No trabalho de Perez-Palencia et al. (2021) isso foi observado, pois, ao avaliar a inclusão de protease na dieta de leitões em fase de creche, foi encontrado que a protease diminuiu a incidência de diarreia na fase.
Outra ação da protease seria manter a integridade do intestino delgado, como altura das vilosidades e redução da profundidade da cripta (Chen et al., 2017), o que também favorece a absorção de nutrientes. Acredita-se que a protease também é capaz de hidrolisar proteínas com ligações dissulfeto, como a glicina e a β-conglicina. A protease se liga à parede intestinal dos animais, reduzindo seus efeitos deletérios sobre a mucosa (Zuo et al., 2015; Farias, 2021).
Considerações Finais
A protease pode ser uma boa opção na busca por melhorar a digestibilidade da dieta e promover a saúde intestinal dos animais, melhorando a produtividade em consequência. A suplementação de protease exógena tem um efeito positivo mais proeminente em dietas à base de ingredientes de origem vegetal, principalmente leguminosas, em que a presença de fatores antinutricionais e a qualidade das proteínas podem limitar o seu aproveitamento pelos animais.
Pensando nisso, o uso da protease pode ter um grande impacto sobre os custos da produção, já que a nutrição representa a maior parte dos custos de produção. Como mostram os trabalhos que alcançaram um efeito positivo do uso da protease, ela se mostra uma boa opção ao usar ingredientes que contenham uma proteína de mais difícil digestão, que tendem a ser ingredientes mais baratos. Então, em um cenário ideal, seria possível diminuir os custos de produção, mesmo investindo na inclusão da protease.
No entanto, é importante avaliar caso a caso a recomendação ideal de uso, considerando a variação entre plantéis, entre animais, entre dietas e entre as fontes de protease. Também é preciso avaliar a interação que esse aditivo pode ter com os demais, que pode tanto potencializar quanto diminuir seu efeito.
REFERÊNCIAS
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